Jogo do Pau

Entrevista a Oscar Cunha, membro do grupo de Jogo do Pau CCRJ Cepães – Fafe

(por Pedro Silva, Jan.2021)

  • De onde é, idade e como se chama?

O meu nome é Óscar Cunha, tenho 44 anos e sou natural de Cepães-Fafe.

  • A que grupo de Jogo do Pau pertence? Quando começou? Que responsabilidades tem no grupo?

Pertenço ao Centro Cultural da Juventude de Cepães, comecei com 11 anos. Atualmente, sou o principal responsável do grupo, sendo que exerço um bocado de todas as funções e todas as decisões são efetuadas por mim.

  • Como se organiza o grupo em termos de treinos e membros?

Desde sempre, que temos um treino fixo semanal, o que facilita a vida a todos os membros pois já temos aquele horário destacado para o Jogo do Pau e conseguimos organizar a nossa vida pessoal e profissional de modo a estarmos presentes. Contudo, quando temos atletas que mostram disponibilidade para mais treinos de modo a evoluírem mais rapidamente, agendamos 1/2 treinos durante a semana.

  • O que é o Jogo do Pau para si?

Gostaria de descrever tudo o que o jogo do pau representa para mim, porém é muito difícil escrever tal coisa. Acho que uma palavra que mostra o apreço e carinho que tenho por esta arte, que tem sido uma companheira de vida, é a palavra “paixão“.

  • Quem é/são o seu mestre(s)? Como aprendeu? Porque quis aprender?

Os mestres da nossa escola são dois: o Mestre José Avelino Nogueira e Mestre Carlos Ferreira de Melo. Desde cedo, que vivencio o jogo do pau na minha vida, visto que o Mestre José Avelino é meu pai. Então, desde pequeno que tinha essa curiosidade, pois é uma tradição de família que me foi incutida pelos meus entes queridos.

A curiosidade começou a sugerir cedo, uma vez que Cepães é uma terra pequena e vivemos todos perto uns dos outros. Víamos os mais velhos a fazer e queríamos imitar e seguir o exemplo deles. Sendo eu na altura, uma criança, a brincar à bola com os filhos dos outros membros, víamos os nossos pais a praticar o jogo do pau. Outra grande recordação, era quando tínhamos as férias-grandes, treinávamos todos os dias, e assim começou a sugerir este gosto. Na altura era difícil entrar para o jogo do pau, pois tínhamos que esperar 1 ano, em que observávamos os membros a jogar e só depois desse ano podíamos começar a praticar. Então, junto com os meus colegas, nos nossos tempos livres, imitávamos os mais velhos e passávamos grande momentos. O campo em que treinávamos também era perto do Mestre Carlos, por isso quando ele chegava do trabalho passávamos umas boas horas a aprender as táticas com ele.

  • Que história, que idade em resumo, tem o vosso grupo de Jogo do Pau?

O grupo, com o nome é conhecido hoje em dia, Centro Cultural da Juventude de Cepães, sofreu alterações no passado. Assim, os nossos mestres foram os principais responsáveis por trazer esta belíssima e enriquecedora arte para Cepães. Quando iniciaram esta arte, tiveram o Mestre Qéu como professor e estavam ligados à Sociedade Recreio Cepanense. Mais tarde, tiveram também o Sr. José “Mecas” como professor e deste modo, deixaram esta associação e estavam ligados à Casa do Povo de Cepães, ficando lá durante 2 ou três anos. Após isto, fundaram o Centro cultural conhecido hoje, sendo que ainda muitos dos membros iniciais estão presentes na actualidade.

  • Qual é a visibilidade cultural do grupo, quer na região, quer fora dela?

Na nossa região o jogo do pau tem fortes raízes, pois é um jogo que está enraizado na nossa cultura Fafense e esteve presente ao longo da história de Fafe, apesar de ter começado a ganhar notoriedade nos últimos anos. Fora da nossa região, temos um grupo na Suécia e na Bélgica ligado à nossa escola. Temos muito orgulho na nossa escola, pois tanto na nossa região, como nos países referidos, tentamos transmitir a nossa arte com as suas técnica. Podemos depois observar esta devoção, pois é uma arte consideravelmente procurada, por ser tão característica e distinta.

  • Que projectos, num passado recente, desenvolveu no grupo de Jogo do Pau de Cepães?

O nosso grupo tem vindo a desenvolver muitos projetos, sendo que alguns que já foram realizados, contudo outros ainda estão em espera para se por em prática. Em 2019, tivemos um encontro do Jogo do Pau em Fafe, inteiramente organizado por nós, o qual nos deixou muito orgulhosos, por juntar várias escolas e mostrar as diferentes técnicas. Além deste encontro, tivemos um projeto desenvolvido juntamente com uma fundação (ILF) dos Estados Unidos da América, com o principal objetivo de divulgar o jogo do pau, onde foi documentado os diversos estilos da nossa arte. Foi uma experiência única viajar até ao Estados Unidos e mostrar a nossa arte, tanto como a vinda dos nossos colegas americanos ao nosso encontro. Estamos a desenvolver juntamente com as outras escolas do país a Federação Portuguesa de Jogo do Pau e a sua ativação e futura estrutura. Também tivemos recentemente uma recriação histórica e teatral, em Cepães e Fareja, que foi uma experiência fantástica. Além disto, também estamos a desenvolver um projeto mais virado para os nossos jovens. O ano passado também, criamos o nosso website, que foi um grande passo nesta era tão digital. Por fim, também fizemos, em cooperação com o município de Fafe, uma plantação de árvores de lódão, pois necessitamos de árvores para as nossas varas.

 

  • Que apoios têm? Como sobrevive o grupo?

Um dos nossos grandes problemas, infelizmente, são os apoios, uma vez que são escassos. Apenas temos uma pequeníssima ajuda da Camara Municipal de Fafe, contudo o resto é através do nosso trabalho, nomeadamente, sobrevivemos através das demonstrações que fazemos. Porém, como atualmente estamos interditos de fazer demonstrações [devido à pandemia Covid], a situação é bastante complicada como podem imaginar. Só graças à insistência, à coesão e ao amor que temos pelo Jogo do Pau é que este grupo sobrevive!

  • Falemos agora um pouco da arte/técnica do Jogo do Pau: se fosse explicar a uma pessoa que nunca ouviu falar do Jogo do Pau, como resume? De que arte se trata?

Quando abordamos a temática do Jogo do Pau, percebemos imediatamente através do nome que é uma arte através do pau, no qual reside uma série de técnicas e táticas de defesa e ataque. Sendo que é uma arte tradicional, usada nos tempos antigos e que em Fafe tem umas características particulares.

  • Como era o Jogo do Pau quando começou comparando com a atualidade no vosso grupo?

Estamos perante grandes diferenças sobretudo a nível de visibilidade, pois inicialmente, não tínhamos a visibilidade que presenciamos atualmente. Outra grande diferença é a procura de novos alunos por esta modalidade, especialmente fora da nossa região, pela nossa escola, o que nos deixa gratos pelo trabalho feito ao longo destes anos. Assim, devidos a estes fatores, também somos mais reconhecidos a nível cultural.

  • Que benefícios sente que traz a prática regular aos praticantes?

Como em todas as artes, os treinos regulares mostram uma evolução significativa nos praticantes. A prática desenvolve tanto a nível psicológico como físico, mas também técnico, pois o Jogo do Pau, é uma arte bastante intensa.

  • Falemos um pouco do panorama geral do Jogo do Pau no país. Em 2019 em Fafe realizou-se um grande encontro de Jogo do Pau. Quer dizer que há mais escolas no país? Estão organizados? Têm projectos?

O Jogo do Pau a nível nacional está estagnado, tanto pela falta de apoios, que leva as escolas a não terem projetos futuros, pois não existe um suporte para os mesmos, mas também, pela falta de organização. Existem 12 escolas espalhadas pelo país (Continente e Ilha Terceira). Devido à situação que atravessamos, muitos planos ficaram estagnados, em especial, o nosso Encontro anual, que tanto estimamos, contudo esperamos reaver este ano se for possível. No entanto as boas notícias é que estamos a restruturar uma federação antiga, para melhorar estes aspetos e muitos mais.

 

  • O jogo do pau tem um passado bem documentado? Como se originou? De onde terá vindo?

Não, temos algumas dificuldades com as raízes do passado, sobretudo a sua origem. Apesar disso, sabemos através dos nossos mestres que o Jogo do Pau é uma prática antiga, dos nossos antepassados, existindo documentos que o comprovam. Contudo, não temos uma data que mostra quando o jogo do pau foi originado na região ou mesmo no país. Porém, graças a algumas fontes e trabalhos documentais, sabemos que aqui em Cepães/Fafe, a nossa “linhagem” de mestres vai em retrospetiva até cerca de 120 anos atrás.

  • O Jogo do Pau é então a mesma arte em todas as escolas do país, ou é diferente, consoante a região?

                O jogo do pau varia de escola para escola, sendo que em algumas regiões os estilos tendem a ser parecidos, mas com diferenças técnicas.

  • Trata-se então de uma arte única, típica da região e do país, mas, contudo, pouco conhecida. O que acha que falta para que o Jogo do Pau tenha maior reconhecimento?

Primeiramente, falta-nos a nível nacional um reconhecimento, tanto por parte do reconhecimento do nosso governo, como a nível de apoios. Pois estamos perante uma arte tradicional portuguesa, que merecia o seu apreço pela arte única que é; não há nada repetido, igual no resto do mundo. Assim sendo, se tivéssemos este reconhecimento, estaríamos a falar de uma enorme mudança, pois seria o principal motor, quer para o interessa da nossa população, quer para nós jogadores do pau.

  • Para finalizar. Há alguma peripécia que queira contar, vivida nestes anos todos de Jogo do Pau?

Existem variadas histórias que tenho em apreço, ao longo destes anos. Porém, existe uma história carismática. Quando tinha 17 anos, fazia parte do Rancho Folclórico de Arões São Romão, que por sua vez tem uma encenação musical que acabava a jogar ao pau. Numa dessas demonstrações, em Coruche, fizemos a encenação com a dança folclórica, que acabou comigo a jogar contra o meu colega Tozé.. Estamos a jogar e eu mando uma pancada e tiro-lhe um bocado da sobrancelha. Assim, entra o meu pai no palco para nos separar, e, não tarda nada, o palco estava cheio de sangue e o Tozé também. Contudo, o público estava ao rubro a bater palmas e a pensarem que era parte da encenação, e que o sangue era feito com tomates/molho de tomate. Só mais tarde perceberam, quando chegou a ambulância, que tinha sido real e o meu colega estava aleijado e que não eram tomates. Obrigada 😊